Registrar a compra do imóvel com valor menor do que pagou? Não caia em tentação!

Quando alguém faz uma transação imobiliária, incidem muitos custos sobre o valor da compra do imóvel, tais como: lavrar a escritura, recolher impostos, registrar no cartório, honorários advocatícios.

Por causa disso, muita gente cai na tentação de colocar um valor menor no contrato assinado, pagando a diferença “por fora” ao vendedor.

Não faça isso! Existem vários motivos para você não querer entrar em ciladas dessa natureza.

O primeiro motivo, e mais óbvio de todos, é que essa atitude configura crime contra a ordem tributária (tipificada no inciso I do Art. 2º da Lei nº 8.137, de 1990).

A lei proíbe as pessoas de fazer declarações falsas para não pagar os tributos devidos. A pena é de detenção (de seis meses a dois anos) e o pagamento de multa na esfera penal.

Ademais, ao descobrir o ilícito, a fazenda pública pode, além de cobrar o imposto sonegado, aplicar uma multa tributária bem salgada.

Mas, fora da área criminal, também existem razões para você não falsear o valor na escritura, pois essa mentira pode causar enormes dores de cabeça.

Imagine, por hipótese, que um apartamento vale R$ 900 mil, mas a escritura de compra e venda foi feita no valor de R$ 600 mil. Os outros R$ 300 mil foram pagos por debaixo dos panos.

Quais problemas essa situação poderia gerar? Veremos a seguir.

Fraude à execução e fraude contra credores

Se o vendedor estiver enfrentando problemas com credores, o negócio de compra e venda poderá configurar um conluio entre o comprador e o vendedor para prejudicar as pessoas para quem o vendedor estava devendo.

Assim, se o comprador descobrir essa situação e quiser sair da enrascada, desfazendo o negócio, pode acabar recebendo de volta apenas os R$ 600 mil registrados, não os R$ 900 mil pagos. Aliás, o comprador também pode acabar perdendo esses R$ 300 mil se o credor ajuizar ação para anular a compra e venda.

O vendedor movido por má-fé

Tanto o comprador como o vendedor sabem que o apartamento vale R$ 900 mil. Mas, o que acontece se, pouco tempo depois, o vendedor decide rever o negócio, alegando que houve vício por lesão?

Segundo o Código Civil, a lesão ocorre quando uma pessoa inexperiente ou muito necessitada aceita receber na venda (ou pagar na compra) um valor muito desproporcional, em função de sua condição de ingenuidade ou de desespero.

Portanto, alegando lesão, o vendedor pode tentar desfazer o negócio e, assim, pegar o imóvel de volta, devolvendo apenas os R$ 600 mil escriturados. Ou poderia até querer manter o negócio, desde que o comprador pagasse mais outros R$ 300 mil.

A preferência de compra pelo locatário

Se o imóvel estiver alugado com o contrato de locação averbado junto à matrícula do imóvel (pelo menos trinta dias antes da alienação), o locatário pode alegar que o dono do imóvel não lhe ofereceu o direito de preferência.

O direito de preferência garante ao locatário – caso o proprietário queira vender o imóvel – o direito de comprá-lo nas mesmas condições oferecidas a terceiros.

Assim, o locatário preterido pode reclamar do vendedor perdas e danos, por não ter sido avisado sobre essa venda a um preço módico, ou, até mesmo, comprar pelo valor declarado de R$ 600 mil o imóvel que vale R$ 900 mil.

A incidência de Imposto de Renda no lucro da revenda

Se o comprador pagou “R$ 600 mil” pelo imóvel e depois o vendeu por R$ 900 mil, pagará imposto de renda sobre o “lucro” dessa transação, ou seja, em cima de R$ 300 mil.

A venda por representante ilegítimo de Pessoa Jurídica

O negócio não tem validade jurídica se quem assinou os papeis da venda do imóvel não representava legalmente a PJ, dona do apartamento. Assim, se o negócio for desfeito por esse motivo, o comprador também poderá receber de volta apenas os R$ 600 mil escriturados, perdendo a diferença.

Conclusão

A compra de um imóvel é muito importante para uma pessoa, pois representa um patrimônio relevante. Muitas vezes, a compra do imóvel é um investimento para durar a vida toda. Por isso é preciso tomar muito cuidado ao adquirir um imóvel.

Como se viu acima, existem muitas situações que mostram o certo a se fazer: lavrar a escritura de compra do imóvel com o valor correto, sem mais, nem menos.

Vai comprar um imóvel? Não caia em ciladas: consulte sempre um advogado.

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Referência bibliográfica:

SILVA, B.M. “Compra de Imóveis: Aspectos Jurídicos, Cautelas Devidas e Análise de Riscos”, – 13. ed. – São Paulo: Atlas, 2021.

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